quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

ANO 2009 - AMOR VERSUS ÓDIO

Em menos de doze horas estaremos entrando no ciclo do ano 2009. A unção deste novo ciclo de tempo vem vinculado a Iansã e Oxossi. Iansã – Rainha dos raios. Oxossi – Caçador por excelência. Com a junção das duas forças, certamente haverá muita discórdia, privações e tragédias humanas. Assim como na vida existencial, nada é definitivo. Maior que qualquer força negativa manifestada pela integração oculta, o homem possui a superior grandeza infinita que rege seu próprio destino. Ainda que se alastre as piores catástrofes sobrenaturais, ainda sim, o homem se levantará das cinzas para reconstruir. Mesmo que os valores éticos sejam confundidos para que a ganância esteja à frente da verdade, o homem de fé lutará incansavelmente para se libertar das garras dos caçadores implacáveis.
Será indubitavelmente uma árdua tarefa destituir a guerra apregoada para 2009. Pois, decididamente o mal caminhará emparelhado com o bem. O que é certo será trocado pelo o errado. A moral será posta de lado. A ética será sepultada diante dos nossos olhos. Vencer esses malefícios depende da nossa força positiva. Somente a união dos homens justos, poderá estripar a derrocada da humanidade. Por mais que se queira, e tenha forças positivas para vencer os infortúnios providos, se faz necessária a união das forças positivas.
Como disse o poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto: _ “Um galo sozinho não tece uma manhã”. Com a bênção de Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo, e, com a proteção de todos os orixás do bem tenhamos todos, um ano 2009 de vitórias!!!

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

POESIA - DEMANDA NATALINA

O que há de novo?
Outro dezembro

Trânsito estagnado

Consumismo desenfreado
Shoppings abarrotados
Papais Noéis chacoalhando suas sinetas
Lâmpadas multicoloridas
Presentes comprados a perder de vista
Comida em extravagância
Nada há de novo
É somente mais um dezembro.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

POESIA - RECONSTRUÇÃO

Reacende a vela que havia apagado
para iluminar a claridade do sol.
Refazer os passos
desfeitos na trilha da perdição.
Recomeçar do ponto de partida
sem olhar para trás.
Reconstruir os moinhos
levados pala enxurrada de lagrimas
Recriar os filhos
para que não sofram as mesmas dores.
Reimprimir os diagnósticos
com a cura das doenças incuráveis.
Republicar as notícias
que trazem finais felizes.
Reproclamar a República
e banir os políticos corruptos.
Replantar o verde
abocanhado por homens inescrupulosos.
Reanimar a vontade de viver
pois tudo depende de você.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

POESIA - PESSOA

Este poema foi escrito em 1990.

Procuro quase sempre encontrar você
mesmo sem querer...
A vida é feita de muitos quereres, quase sempre!
Apesar de buscá-la, sem querer
quero tê-la por querer
dominar meus quereres.
Maculo a sílaba da palavra querer
porque não quero dizer
o que pretendo fazer com os quereres.
Restou-me a frase dita pelo o poeta

na primeira pessoa
que queria expor outros quereres.
E eu(até agora)nada fiz para revelar

o querer oculto.

domingo, 9 de novembro de 2008

POESIA - PROVÍNCIAS SENTIMENTAIS

Queria ser o mundo
Largo e profundo.
Para ser descoberto e devastado
Delineado em províncias sentimentais.
Onde os quintais
Fossem um só vão.
As caravelas ancorariam em mim
Os navegantes enterrariam seus tesouros no novo mundo
E tudo seria um só coração.
Sem preconceito:
O índio poderia amar a mulher branca
A mulher branca teria o direito de amar o homem negro
E o homem negro amaria sem receio da cor.
No novo mundo todos os homens se amariam
Independente do sexo, cor, religião e condição social.
Somente o amor terá força para reinventar o mundo.

domingo, 2 de novembro de 2008

MINEIRO-UNIVERSAL

Este poema escrevi no dia 17 de agosto do ano 1987, logo após assisti no “Jornal Nacional” a fatídica notícia do falecimento do maior poeta da língua português. Por ser hoje um dia dedicado a memória dos falecidos, postei esta singela homenagem, ao inesquesível poeta mineiro-universal.

POETA ABSOLUTO

In memorian
Carlos Drummond de Andrade

O poeta é filho das Maravilhas,
porque só fala do belo.
Vive em busca do bonito
para escrever o que tinha dito.

Carlos Drmmond,
Carlos de Minas Gerais,
aonde está meu jovem poeta
Que partiu pra nunca mais.

Sua vida, seus “Boitempos”
seus caminhos escritos à mão,
fazem com que os novos poetas
nunca falem de solidão.

A “Cadeira de Balanço”
que a vida lhe deu,
hoje você a perdeu,
mas deixou-nos a cultura
que entre um balanço e outro
nos escreveu.

Vida que nos dá a vida
para a gente viver,
vida porque Carlos Drummond teve
que deixar de viver?

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

NOVO ESTÁGIO DE VIDA DO JORNALISTA NELSON FRANCISO

O poeta Álvares de Azevedo disse através da poesia que: “A morte é a mais leviana de todas as prostitutas”. Hoje é um dia lúgubre para mim. Ainda não fez sentido, a fatídica notícia, que acabei de receber. Morreu o jornalista boquinense Nelson Francisco dos Santos. Estou perplexo! Petrificado, procurando entender o inexplicável sentido da morte. Como pode uma pessoa tão jovem, tão bonita, tão cheia de vida, portadora de um grande talento comunicativo nos deixar órfão? Órfão de seu largo, belo e enigmático sorriso.
Conheci Nelsinho, em meados dos anos 80, eu já seminarista, e ele coroinha da Paróquia Sant´Ana, na cidade de Boquim, interior sergipano. Sempre prestativo e fazedor de amigos, logo conquistou a todos e deixou sua marca indelével por onde passou. A última vez que estive com Nelsinho, foi no final dos anos 90, depois desse nosso reencontro, ele morando em Cuiabá e eu no Rio de Janeiro, somente houve contato entre nos dois por telefone e por correspondência. Neste instante lembrei-me de uma estrofe de uma música do maestro Antônio Carlos Jobim: “Breve é a vida, longa é a arte”. Eu acho que é este o sentido, que encontrei para minimizar a dor da perder irreparável. A breve vida de Nelsinho será prolongada através da sua arte de comunicação. Talvez nada disso que escrevi faz sentido, se assim for não estou triste, porque também a morte não faz sentido. Sendo assim, tudo não passou de um novo estágio de vida para Nelsinho.
Para fazer uma tradução da minha sensação no momento, coloquei em poesia, todo o abstrato da morte de um ante querido. Porque assim como a poesia, a morte não é óbvia.

CONSCIÊNCIA ABSTRATA

A vida construída e vivida em roda-gigante
Com sorriso largo que abrange.
As palavras publicadas
Eram-lhe sagradas
De forma
Contemplada.
Mesmo para quem se foi
Encontra-se
Acha-se aqui presente
Para perpetuar
O que estava escrito
E nunca deixá-lo de ama.


In memorian Nelson Francisco dos Santos

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

ARGUMENTO E ROTEIRO DO CURTA-METRAGEM: JÁ VI ESSE FILME

Este roteiro, da minha autoria, foi desenvolvido em setembro de 2006, porém, somente no dia 10 de outubro de 2008 é que recebemos o patrocínio de incentivo cultural para ser filmado. As gravações começaram em novembro/08. De antemão apresento a vocês o que brevemente vocês assistiram nos cinemas através de: imagens, falas e sons.

ARGUMENTO
O curta Já Vi Esse Filme, tem como cenário a cidade de Três Rios, interior do Estado do Rio de Janeiro. E como decurso de ação está o falecimento do poeta, ex-vereador e professor Otto Diniz.
O plot começa quando a família (Esposa e filho) descobre, que não detém de nenhum recurso financeiro para fazer o enterro do professor. Após várias negativas das pessoas procuradas no intuito de receber ajuda para o funeral, a família resolve vender o único bem valioso deixado pelo falecido: os livros.
Quando o livreiro Hermes (Proprietário da Livraria & Sebo) chega na casa do falecido para comprar os livros, e se depara com o corpo inerte em cima da cama, e ao perceber, que se trata do professor Otto Diniz, decide fazer com que toda cidade de Três Rios, reconheça a grande importância do professor Otto Diniz para a cidade, como o maior benfeitor de todos os tempos.
De repente, através dos esforços do livreiro Hermes, todos os tririenses, tomam conhecimento do legado político e social deixado pelo professor Otto Diniz, e a população inteira lhe presta a última homenagem.

ROTEIRO
CENA 01
TRÊS RIOS – TAKES VARIADOS/ EXT./ MANHÃ
- Depois de a câmera mostrar o Rio Paraíba cheio e violento, vêem-se outros pontos importantes da cidade: Prefeitura, com as bandeiras do Brasil, do Estado, e do Município hasteadas, Câmera Municipal e Monumentos Históricos. A imagem mostra o relógio da igreja Matriz de São Sebastião, marcando 6h30min.(Ouvem-se em off, badaladas do sino). Vêem-se carolas, com terços nas mãos, entrando na igreja para assistirem à missa da manhã. Na Av. Condessa do Rio Novo mostra um movimentado fluxo de veículos nos dois sentidos. É dado close nas legendas do destino dos ônibus coletivos ( Purys – Moura Brasil – Pilões – Jaqueira – Morada do Sol - Ponte das Garças e outros bairros). Vêem-se pessoas entrando, saindo dos ônibus. De repente, ouve-se (em off) um anúncio fúnebre – “ Os familiares, esposa, filho e amigos de Otto Diniz, professor, escritor, poeta e ex-vereador de Três Rios, convidam a população tririense para o seu sepultamento hoje, às 16hs no cemitério municipal. O féretro sairá da sua residência na rua Cândido Portinári,1903. Desde já, agradecem a todos os que comparecerem a esse ato de fé e piedade Cristã.” – A câmera mostra o semáforo mudando o sinal verde para o vermelho. Em seguida, vê-se o fusca da empresa “Sonorizações Bello”, parado, esperando o sinal abrir, repetindo o anúncio fúnebre. Em close vê-se o motorista do fusca falando ao celular.
CORTE
CENA 02
ENTRADA PRINCIPAL DA “GALERIA CENTRAL” / INT./MANHÃ
- Hermes entra na “Galeria Central” (identificar o lugar pelo painel), vai direto a portaria recolher correspondências no escaninho.
Porteiro 1
(Gordo,demostrando cordialidade) __ Bom dia, seu Hermes!
Hermes
(Vestido socialmente com uma pasta na mão, também demonstra cordialidade)__ Bom dia! (Retirando as correspondências) Espero que o dia de hoje seja tão bom quanto foi o dia de ontem, tanto no campo profissional como no pessoal. Desejo isso pra mim e pra você.
- O porteiro agradece a gentileza, e Hermes sai em direção a sua Livraria & Sebo. Passa pela dona do restaurante da galeria (cumprimenta-a com um bom dia), em seguida passa por um casal, também cumprimenta-os, toma a esquerda e desaparece.
- A imagem continua no corredor, mostrando o encontro da dona do restaurante com sua funcionária. As duas levantam a porta de ferro do restaurante e entram e abaixam a porta.
CORTE
CENA 03
CORREDOR DA “GALERIA CENTRAL” ONDE FICA A LIVRARIA/INT./MANHÃ
- Vê Hermes, de costas, se dirigindo à Livraria. A câmera, em close mostra o Gullar andando de um lado para o outro em frente à Livraria. Muito tenso, fumando, demonstra nitidamente um descontrole emocional. Vendo Hermes colocando a chave para abrir a porta, Gullar se dirige a ele depois de jogar o cigarro na lata de lixo. Uma pessoa fala no orelhão ao lado da Livraria.
Gullar(Falando de forma nervosa) __ Seu Hermes?
Hermes
(Parando o que estava fazendo) ___ Sim. Em que posso servi-lo, meu jovem?
Gullar
___O senhor tá comprando livros usados?
Hermes
___ Claro, como você pode ler o letreiro (mostra o letreiro, apontando com o dedo, e lê em voz alta) Livraria & Sebo Palavrador: Compramos * Vendemos * Trocamos e Alugamos livros novos e usados. Não estou certo?... Agora, diga-me que livro você tem pra vender? (Faz essa pergunta, de costas para Gullar, enquanto levanta a porta).
Gullar
__ O que eu tenho não é um livro, são vários livros, mais ou menos 2000(dois mil) livros, mais um tanto de fitas de vídeo e outro de disco em vinil.
- Os dois, já na parte de dentro da livraria. A segunda porta continua fechada. Hermes liga o interruptor das luzes da loja. A câmera dá uma geral da livraria.
Hermes
(Olhando Gullar de cima para baixo) __ Como é mesmo seu nome, meu jovem?
Gullar
__Gullar senhor! (Impaciente)
Hermes
___ Gullar, você não me parece ter idade suficiente para ter lido tantos livros assim...estou certo? Espere aí, não me diga que você subtraiu de alguém esses livros.
Gullar
___Não... Esses livros eram (choroso, close nos olhos lacrimejados ) do meu pai. Ele morreu e, para mim, os livros não têm nenhuma serventia... Estou precisando de dinheiro. (Enxugando as lágrimas com as mãos)
Hermes
__ Perdão pelo meu comentário descabido (Sem jeito). Mas não se apavore. Você não é o primeiro nem será o último, que vende os livros deixados pelo pai que morreu. Quase todo dia vejo esse filme. Estou certo? Acredite, muitos jogam até fora... no lixo. Você, vendendo-os, com certeza eles serão bem aproveitados. Você me vende e eu vendo para outras pessoas. É assim que funciona o negócio.
Gullar
___ Então, eu posso trazer os livros para o senhor comprar?
Hermes
___Calma rapaz, o melhor é fazermos o seguinte: eu vou até a sua casa. Lá, faço a avaliação dos livros e, se o valor oferecido por mim estiver dentro de suas expectativas, eu pago na hora.
Gullar
(Assustado) Ir a minha casa? Hoje? Agora?
Hermes
___Sim, isso mesmo que você ouviu. É preciso que eu veja a conservação dos livros, para poder avaliar com justiça... Há algum problema em eu ir a sua casa? Se você esperar um pouco... o tempo de eu acabar de abrir a livraria e esperar minha funcionária chegar, eu vou com você até sua casa. Pode ser?
Gullar
____É que eu tenho que resolver isso antes das 10h.
Hermes
(Olhando para o relógio na parede da livraria) ___ São 8h. Dá tempo suficiente. Mas me diga uma coisa: Como se chama seu falecido pai?
- A conversa é interrompida pelo toque da campanhia do telefone. Por esse motivo Gullar não responde a perguntar de Hermes, que sai para atender o telefone. Enquanto Hermes vai atender o telefone Gullar sai da loja e fica do lado de fora fumando.
Hermes
(Ao telefone) __ Livraria & Sebo Palavrador. Bom dia... Oi, Amanda, pode falar, estou te ouvindo... Não há problema algum você chegar atrasada, eu seguro as pontas aqui. Estou certo? Fica tranqüila. O importante é a saúde da sua mãe. Estou certo? Tá bem... apresente meus votos de melhoras pra sua mãe. Estou certo?
- Hermes coloca o telefone no gancho e procura por Gullar. Não o encontrando, resolve abrir a outra porta da livraria. Levantando a porta, vê Gullar falando ao telefone do orelhão, nervoso e fumando. A imagem mostra Hermes ligando os computadores e, de repente, entra Gullar.
Gullar
____ Liguei pra minha mãe, e ela falou que o senhor pode ir ver os livros. Precisamos urgentemente do dinheiro.
Hermes
(Interrompendo Gullar) ___ Meu jovem, todo mundo precisa de dinheiro, estou certo? É o dinheiro, e sempre foi e sempre será a mola mestra que rege o homem. Porém você terá que esperar até as 9h...estou certo? - pois minha funcionária acabou de ligar, avisando que se atrasará, em virtude de a mãe dela amanhecer passando mal. Ela terá que aguardar a chegada da irmã dela, que fará companhia à moribunda. Estou certo? Infelizmente (pegando um bloco de anotações para anotar o endereço de Gullar), você vai ter que me aguardar em sua casa... Anote aqui o seu endereço por favor.
Gullar
(Escrevendo o endereço) ___ É, não tem outro jeito né? Vou esperar o senhor às 9hs na minha casa.(Entregando-lhe o papel) Aqui está o endereço.
Hermes
___Combinado... às 9hs impreterivelmente, estarei lá. (Olhando o endereço)
CORTE
CENA 04
A FRENTE DO CAMELÓDROMO/EXT./MANHÃ
- A câmera faz o panorama de um céu infinitamente azulado; depois, a imagem vem descendo devagar. Em seguida, vê a parte de uma casa de construção antiga, de muro baixo. Falando ao celular, encostada no muro, está D. Cecília, a mãe de Gullar. Ele chega, abre o pequeno portão e entra, e fica esperando a mãe acabar com a conversa pelo telefone.
Cecília
___ Então tá. Peço desculpas por ter encomodado o senhor. (Depois de desligar o aparelho de celular). E aí, meu filho, cadê o homem que vinha com você para comprar os livros?
Gullar
___O dito cujo só vai poder vir às 9hs. Aconteceu um imprevisto com a funcionária dele. Portanto, somente às 9h. E a senhora conseguiu alguma ajuda?
Cecília
___Que nada! (Mostrando o celular) Já liguei pra Deus e pro mundo, e nada. Todo mundo falou que sente muito com a morte de Otto, mas não pode ajudar financeiramente as despesas fúnebres. A minha última saída é vender os livros. Acredito que essa quantidade de livros dê, pelo menos, pra pagar o caixão.
Gullar
(Chorando) ___É lamentável que um homem da grandeza do meu pai... se acabe assim... Pra ser enterrado, temos que mendigar um caixão. Ele não merece isso, mãe. (Os dois se abraçam)
Cecília
___Eu sei, meu filho. Ele vai ser enterrado com toda a dignidade que ele merece. Eu lhe prometo.
CORTE
CENA 05
LIVRARIA & SEBO PALAVRADOR/ INT. / MANHÃ
- A câmera mostra a Livraria & Sebo Palavrador. A imagem começa a partir de um “cliente” no computador, usufruindo do serviço de Internet. Depois, no balcão de atendimento vê Hermes, colocando um livro na bolsa (Close no livro), em seguida chega uma cliente com outro livro na mão.
Cliente Um(Uma senhora de uns 40 anos, vestida elegantemente) ___ Eu também vou levar esse outro livro (Close no livro). Por gentileza, pode colocar os dois juntos. Vou pagar com cartão. (Abrindo a bolsa para pegar o cartão de crédito)
Hermes
(Depois de passar o cartão na máquina) ___ Assina aqui, por favor. (Depois de assinar o comprovante, a cliente um sai da livraria. Logo depois, aproximam-se de Hermes duas estudantes de 15 anos, uniformizadas, pedindo informação sobre o Cyber Café)
Estudante Um
(Mascando chiclete) ___Aqui tem serviço de Cyber Café?
Hermes
___Prestamos, sim, esse serviço. Estou certo?
Estudante Dois
(Espevitada) __Como funciona? Qual o tempo mínimo e o máximo de aluguel? É via rádio?
Hermes
___Calma, vamos devagar com o andor. Estou certo? Você faz muitas perguntas, menina. Estou certo? O que eu posso dizer a você é que, no momento, o computador está ocupado (Aponta para o usuário). O tempo mínimo é de meia hora, e o máximo é o tempo que o usuário quiser e tiver dinheiro pra pagar. (Um riso desconcertante)
Estudante Dois
(Mostrando o rapaz com a cabeça)___ Ele vai demorar muito?
Hermes
___Como lhe disse, o tempo que o usuário achar necessário. Estou certo?
Estudante Um
(Puxando a colega pelo braço) ___Tá certo. Mais tarde, a gente volta. Estou certa? (As duas vão embora rindo e conversando entre si)
- A livraria está com cinco figurantes. Uns olham CD’s e DVD’s, outros folheiam livros. A câmera mostra a entrada do cliente dois (Um professor de literatura com uma pasta em uma das mãos e várias provas de alunos pra corrigir na outra mão).
Cliente Dois
(Demostrando bom humor, falantes, os dois amigos demonstram cordialidade entre eles) ___Bom dia, Hermes! E o livro que encomendei já chegou?
Hermes(Meio distante e preocupado) ___Qual foi mesmo? Ah! já me lembrei. É o livro do Patativa do Assaré. Estou certo? Já, sim (Hermes pegou o livro em uma prateleira). Está aqui. (Close no livro) Demorou um pouco, porque isso aqui é uma preciosidade pois o que é precioso é raro. Estou certo?
Cliente Dois
(Colocando mais coisas em cima da cadeira) ___ Você está sempre certo, Hermes! Olha só que maravilha(Folheando o livro, escolhe uma poesia e declama). “Com o Grito do dinheiro, a Justiça não se apruma.”
- Todos os presentes, na livraria, batem palmas. O Cliente Dois percebe uma aflição no semblante de Hermes.
Cliente Dois
___Queira perdoar minha indelicadeza, Hermes, mas noto que algo o está preocupando... Posso ajudá-lo?
Hermes
___Acho que não, conterrâneo. Amanda... ainda não chegou. Já passa das 9h (Olha para o relógio na parede, que marca 9h). Tenho um compromisso às 9hs. Aliás tinha às 9h. Estou certo?
Cliente Dois
___Realmente, não posso ajudá-lo, tenho aula às 9h30min... Não vou poder ficar aqui para você ir ao seu compromisso. Mas por que você não liga para o celular dela, para saber o que está acontecendo.
Hermes
___É o que vou fazer. Mas, antes, deixe acabar de atendê-lo. (Hermes vai até o computador fazer a consulta de preço do livro, mostra o valor ao cliente dois. Este retira o talão de cheque da bolsa e preenche, enquanto Hermes coloca o livro na sacola. O Cliente Dois lhe entrega o cheque e Hermes lhe dá a sacola com o livro. Despendem-se, e o Cliente Dois vai embora. Em seguida, Hermes liga para o celular de Amanda. Ouve o sinal da chamada).
CORTE
CENA 06
TRAVESSIA DO TREM NA LINHA FÉRREA /EXT./MANHÃ
- A imagem começa com a amplidão dos arcos no camelódromo. Vê pessoa conversando no local. Ouve sempre o barulho (Em off) provocado pela passagem do trem. Depois, a câmera acompanha a passagem dos vagões. Afastando a câmera para trás, vê carros, ônibus, motos e pedestres aguardando a vez para fazer a travessia. Alguns pedestres, impacientes, fazem a travessia pela passarela de ferro. Com o término da passagem do trem, a câmera mostra em primeiro plano as pessoas, carros que aguardavam do outro lado. Acontece, nesse momento, um entrosamento dos dois lados. Entre as pessoas, está a Amanda, que procura seu celular, que toca insistentemente, na bolsa.
Amanda
(Falando no celular e com passos apressados) ___ Seu Hermes... (Identificando quem era, pela bina do celular) já estou aqui pertinho... me atrasei mais, porque o trem achou de passar justo agora.
CORTE
CENA 07
A FRENTE DA CASA NA RUA CÂNDIDO PORTINÁRIO/EXT./MANHÃ
- Vê Hermes parando o carro em frente à casa. Desce e tranca a porta do veículo. Procura nos bolsos algo; retira do bolso da calça um papel; confere o número da casa pelo endereço escrito no papel. Procura ver alguém. Não encontrando, começa a procurar a campanhia. Não acha.
Hermes
(Batendo palmas) __Oh de casa... Tem alguém em casa?
Cecília
(Fumando e desconfiada) ___O que deseja?
Hermes
____Aqui é a casa de Gullar? (Olha o papel na mão) ___Sou Hermes, vim fazer avaliação de uns livros que ele tem pra vender.
Cecília
(Demonstrando satisfação em vê-lo, joga o cigarro fora e o convida pra entrar, abrindo o portão) ____Estávamos apavorado; achamos que não vinha mais. Entre por favor. Sou Cecília... mãe do Gullar.
Hermes
(Os dois se cumprimentam com um aperto de mãos) ___Prazer! Perdão pelo atraso, é que aconteceu um imprevisto.
CORTE
CENA 08
SALA DA CASA/INT./MANHÃ
- Uma sala simples, bastante desarrumada, com móveis velhos e danificados. Gullar está dormindo no sofá. A imagem mostra uma grande quantidade de livros empilhados em um canto e os outros em cima dos móveis.
Cecília
(Acordando o Gullar) ___Gullar filho...acorde filho, seu Hermes já está aqui.
- Cecília começa a catar peças de roupas espalhadas pela sala. Gullar acorda se espreguiçando, sem perceber a presença de Hermes.
Gullar
(Meio envergonhado) ___Desculpa pelo senhor me encontrar assim...
Hermes
(Cortando a fala de Gullar e se dirigindo a pilha de livros) ___Assim como, meu jovem? Não se esqueça de que você está na sua casa. Portanto... você pode ficar à vontade. (Contando os livros com os olhos) Se não me falha a memória, disse-me que tinha mais de dois mil volumes... e pela muita experiência adquirida como livreiro, aprendi a contar com os olhos... e posso lhe garantir que, se contar um por um... e recontá-los, não vão dar dois mil livros.
Cecília
___Um instante, seu Hermes... Lá no quarto (Aponta a porta do quarto), tem outro tanto de livros...e aqui, dentro desta caixa(Ela arrasta uma caixa grande com as mãos) tem uma quantidade de fitas de vídeo de filmes antigos.
- Hermes se senta no sofá da sala e começa a ver as fitas de vídeo. Vai tirando as fitas, olha com emoção os títulos dos filmes, depois os coloca ao seu lado no sofá.
Hermes
___Há bons filmes aqui! Raridades mesmo... (Após retirar várias fitas, ele fica maravilhado quando encontra um filme especificamente). Meu Deus, veja o que eu encontrei. “Deus necessita de homens” (Muita emoção). Há anos, andei procurando esse filme, e nunca tive a sorte de achá-lo, nem na França quando lá estive, fazendo meu doutorado em filosofia na Sorbonne. “Dieu a besoin des hommes”, filme que assisti quando era criança... Na verdade, o primeiro filme a que assisti na vida, e nunca... nunca consegui esquecer a bela história contada nesse filme francês... do diretor Jean Delannoy, filmado em 1950! Chego a ficar emocionado com esse achado.(Mostra o filme como um troféu. Hermes tira o lenço do bolso e enxuga as lágrimas).
Gullar
___O senhor quer ver a outra quantidade dos livros lá no quarto, agora? (Ela olha a hora no relógio de pulso) É que a gente tem muita coisa pra resolver... e dependemos do dinheiro da venda dos livros.
Hermes
___Tudo bem... (Abraça o filme com satisfação), pois eu já dava por encerrada a nossa negociação...estou certo? Em vinte anos, como livreiro eu nunca senti tanta alegria em fazer uma compra de livros. Nem mesmo quando comprei o livro “Grande Sertão Veredas”, autografado por João Guimarães Rosa, para o presidente Juscelino Kubitschek.
Cecília
___Mas o senhor precisa ver os outros livros. Quem sabe lá no quarto, também, o senhor encontra outras raridades. Né meu filho? (Demostrando impaciência)
Gullar
___Sim, mamãe... Seu Hermes, me acompanhe por favor. (Sai Gullar na frente, Hermes no meio e Cecília atrás)
CORTE
CENA 09
QUARTO DA CASA/INT./MANHÃ
- A imagem mostra um panorama de todo o quarto. Com cama de casal, alguém deitado e coberto dos pés a cabeça, móveis surrados e livros por toda parte do quarto. Um aparelho de som em cima do criado mudo, toca a música “Ressuscita-me” na voz de Gal Costa. O aparelho é desligado por Cecília que entrou por último no quarto.
Hermes
(Abraçado com a fita de vídeo e falando muito baixo, vem próximo ao ouvido de Gullar) ___Realmente, meu jovem Gullar... você não exagerou quando disse que eram mais de dois mil livros. Estou certo?
Gullar
___Mas por que o senhor está falando tão baixo?
Hermes
(Continuando a falar baixo) ___Não quero atrapalhar o sono da pessoa que está dormindo aí. (Aponta com a cabeça o corpo inerte na cama)
Cecília
___Não...esse aí, não acorda mais não!
Hermes
___Como assim! Quem é esse aí?...
Gullar
___... É meu pai.
Hermes
___Seu pai! (Chocado) Espere aí... você não me disse que seu pai estava morto e, por isso, estava vendendo essa montoeira de livros. (Tenso e preocupado) O que está acontecendo aqui? É o seu pai que está ai? (Apontando e chegando perto do corpo)
Gullar
___Sim, é meu pai, mortinho da silva. O grande intelectual, o pai dos pobres, o político incorruptível Otto Diniz, que tanto fez pela nossa cidade, pelos pobres e desesperados... é como diz o ditado “Rei morto... rei posto”. (Descobre o rosto do falecido, chocando com isso Hermes)
Hermes
__Mas é... o professor Otto Diniz mesmo!
Cecília
____O senhor conhecia meu marido?
Hermes
___Dona Cecília... qualquer pessoa que more nesta cidade conhece seu Otto ou, no mínimo, já ouviu falar dele. Era na minha livraria que, no mínimo, ele marcava presença três vezes por semana. Seu marido era um homem muito admirado e querido.
Gullar
(Revoltado) ___De que adianta ser admirado em vida e quando morre... não ter dinheiro... e ninguém pra ajudar a comprar o caixão pra ser enterrado. Isso é revoltante.
Cecília
___Passei a manhã inteira ligando pra um e pra outro, pedindo ajuda. E a resposta foi sempre a mesma “sinto muito, ele era um bom homem, mas não posso ajudar”. Por isso é necessário que o senhor nos compre os livros...
Hermes
(Segurando a fita) ___Não é necessário vender o maior patrimônio do professor Otto... Muitos desses livros ele comprou na minha livraria... eu vou pagar as despesas do funeral... e em troca não quero nada... peço somente que me presenteie com esse filme. (Ele começa a assinar um cheque em branco e entrega a Cecília) Quero que a senhora gaste o que for suficiente para dar dignidade ao homem que fez tanto pelos seus semelhantes. É o mínimo que eu posso fazer pelo professor Otto Diniz, nesse momento. Estou certo?. Aqui está o cheque em branco.
- Ouve-se a música “Ressuscita-me” instrumental na hora em que Hermes entrega o cheque e até ele descobrir, por completo, o corpo inerte na cama e ficar admirando até chorar.
Cecília
___Ele morreu, fazendo aquilo de que mais gostava: relendo seu livro preferido (Ela tira das mãos do falecido o livro. A câmera dá close no livro do poeta Eduardo Alves da Costa: “No Caminho com Maiakovski”) e ouvindo sua música preferida. (Ela liga o aparelho e ouve Gal Costa cantando “Ressuscita-me”) Era sagrado para ele... dormia todas as noites ouvindo Gal Costa cantando essa música. (A música fica ao fundo) O senhor vai com a gente até a funerária?
Hermes
___Não... a senhora vá com seu filho, que eu tenho que preparar a homenagem que Três Rios... tem por obrigação de prestar ao professor Otto Diniz.
CORTE
CENA 10
FRENTE DO PRÉDIO DA RÁDIO 3 RIOS/EXT./MANHÃ

- A imagem mostra a placa com identificação da rádio e pessoas entrando pela única entrada do prédio. Em seguida vê a imagem da chegada do carro de Hermes. Ele estaciona o carro e entra no prédio apressadamente. A câmera acompanha sua subida pelas escadas que dá acesso à recepção.
CORTE
CENA 11
SALA DE RECEPÇÃO DA RÁDIO 3RIOS/INT./MANHÃ
- Vê a chegada de Hermes à recepção, onde há outras pessoas, aguardando para serem atendidas. Em off, ele conversa com a recepcionista, fazendo-lhe um pedido. Em seguida, ela pega o telefone e faz uma ligação interna. Depois torna a conversar com Hermes e lhe dar uma notícia que o tranqüiliza . Enquanto ele está agradecendo à recepcionista, entra na sala a radialista do programa que está no “ar”. Os dois se cumprimentam com beijos no rosto.
Raquel
(Demonstrando afobamento) ___Ó Hermes, que sangria desatada é essa, homem? A recepcionista me falou que você disse que era coisa de vida ou morte...
Hermes
(Afastando-a pelo braço para um lugar para ficarem a sós) ___Não, minha amiga, eu disse que é um caso de morte... só de morte.
Raquel
(Assustada) ___O que aconteceu, homem de Deus? Assim, você está me deixando com medo. (Olhando para o relógio) E o pior é que não, tenho tempo... pois esta quase na hora de eu entrar no “ar”...
Hermes
____Pois é justamente sobre a entrada no “ar” do seu programa que eu quero lhe falar.. Preciso que você me conceda um espaço no seu programa, para eu convencer a população de Três Rios, do valor inigualável do professor Otto...
Raquel
___Otto Diniz?
Hermes
___Ele mesmo... O homem morreu e não deixou nenhum amparo financeiro, para que a família fizesse seu enterro. Você acredita que todas as pessoas que a viúva procurou pra ajudá-la viraram as costas?
Raquel
___Logo o professor Otto que, em vida, fez tanto por Três Rios... Mas é sempre assim: “Rei morto...rei posto”.
Hermes
___É muito mais que isso, minha amiga... Nesta cidade, sempre foi assim e sempre será... Os poderosos nunca fazem nada pelos pobres... Quando encontram alguém que faz algo, eles o vê como um inimigo, um fora da lei... eles fazem e desfazem ao seu bel-prazer.
Raquel
___Não precisa dizer mais nada, Hermes. Venha comigo! Os microfones do meu programa estão à sua disposição. (Os dois saem pela porta que leva ao estúdio)
- A câmera volta para a mesa da recepcionista, depois que em off ouve-se a campainha do telefone. A recepcionista atende o telefone e depois que ela desliga, o aparelho a câmera mostra a caixa de som na parede da recepção e se ouve a chamada do “Programa Raquel Carvalho”.
CORTE
CENA 12
- A imagem mostra o comércio abrindo suas portas na Rua Walmir Peçanha. Vê algumas portas de ferro sendo levantadas e pessoas saindo e entrando em outras lojas.
CORTE
CENA 13
ESTÚDIO DA RÁDIO 3RIOS/INT./MANHÃ
- A câmera fica em close na placa vermelha com os dizeres “NO AR”. Enquanto em off ouvi a voz da radialista Raquel Carvalho.
Raquel
____Minhas amigas donas de casa... o nosso programa tem o patrocínio do “Supermercado Bramil”...somente no Supermercado Bramil, todos os dias, vocês encontram o melhor preço da cidade para fazer suas compras. “Supermercado Bramil” onde é sempre um prazer atender você. - A imagem mostra a mesa com Raquel dizendo a última estrofe do reclame e Hermes, os dois sentados. Raquel procura um papel em meio a tantos e não encontra e resolve falar da presença de Hermes.
Raquel
___Hoje, não vou seguir o roteiro normal do nosso programa, porque tenho que abrir o microfone, para o Sr. Hermes Cardoso dar uma triste notícia à população de nossa querida Três Rios. Hermes, por favor, o microfone é seu.
Hermes

___Nossa cidade, a partir de hoje, não mais será a mesma... pois, para nossa tristeza e profunda dor, faleceu hoje aquele que indubitavelmente foi o maior de todos os trirrienses: o professor Otto Diniz. Quem, de uma forma ou de outra, não foi assistido ou recebeu um ensinamento do professor, poeta e ex-vereador? Por essa razão, eu convoco toda a população de Três Rios, para dar seu adeus àquele que divulgou, através de sua genialidade e solidariedade, o nome da nossa cidade. É o mínimo que podemos fazer a um homem que esqueceu de si mesmo, dando tudo que tinha em vida aos outros e, morto, nem o dinheiro para comprar seu caixão deixou.
CORTE
CENA 14
VÁRIOS PONTOS COMERCIAIS E RESIDENCIAIS/EXT./MANHÃ
- Vêem-se várias lojas do comércio e residências ouvindo, pelo rádio, o programa e as pessoas emocionadas e algumas chorando.
CORTE
CENA 15
ESTÚDIO DA RÁDIO 3RIOS/INT. MANHÃ
Raquel
___Hermes, a gente nota nitidamente que você está abalado, tomado por uma forte emoção...
Hermes
___(Chorando) ___É que, para mim, se existe alguma coisa que incomoda e fere profundamente... é ingratidão. Ingratidão é o pior de todos os sentimentos... E saber que o corpo do professor Otto... está até agora em cima da cama, e a família teve que vender os livros, a única herança deixada por ele, para poder comprar o caixão... isso é cruel demais, é inaceitável...
Raquel
___Realmente (Emocionada e chorando) e para que horas está marcado o sepultamento? De onde vai sair o féretro?
Hermes
___A família marcou para as 16h, a princípio sairia da casa do falecido... Eu, porém, moverei o céu e a terra, para que o professor Otto receba todas as homenagens de um grande benfeitor... Saindo daqui... vou direto falar com o prefeito, solicitar ao poder executivo que o município tome a frente das homenagens. Sendo assim... o corpo será velado na Câmara Municipal.
Raquel
___Mas... Hermes, você acha que os poderosos desta cidade vão concordar com essa homenagem? Você mesmo falou que os poderosos viraram as costas para a viúva, quando esta solicitou ajuda para comprar o caixão para o professor Otto.
Hermes
___Eu tenho certeza de que, se eu for sozinho, terei poucas chances de convencer o senhor prefeito, mas se eu for acompanhado por um grupo de pessoas, o prefeito acatara nossa reivindicação. Por um mais um... vou convencer a população tririense. Vamos decretar luto oficial nesta cidade pela morte do professor Otto. Todos devemos ir à Câmara Municipal. Hoje, é feriado em Três Rios, porque todos devemos nos despedir daquele que foi o maior benfeitor de Três Rios em todos os sentidos.
CORTE
CENA 16
RUAS COMERCIAIS DE TRÊS RIOS/EXT./MANHÃ
- A imagem mostra várias lojas sendo fechadas, funcionários arriando as portas. Diversas pessoas chorando, lamentando a morte do professor Otto.
CORTE
CENA 17
PREFEITURA MUNICIPAL DE TRÊS RIOS/EXT./MANHÃ
- A câmera mostra em close a fachada da prefeitura (Vê a placa com a inscrição). Na parte interna, a imagem dá um plano geral de alguns setores da prefeitura, depois se vê a inscrição na porta “Gabinete do Prefeito”. A câmera mostra a mão do garçom batendo na porta e, na outra mão, ele segura uma bandeja com água e cafezinho.
CORTE
CENA 18
GABINETE DO PREFEITO DE TRÊS RIOS/INT./MANHÃ
- Em off, ouvi a voz do prefeito falando com Hermes, enquanto o garçom se dirige até eles. O prefeito está sentado na sua mesa e Hermes no lado oposto. O garçom serve cafezinho ao prefeito em seguida a visita.
Prefeito
___É uma perda irreparável! Apesar de sermos politicamente adversários... devo admitir que o professor Otto Diniz foi um homem que mais fez coisas boas para Três Rios. Obrigado! (Agradece ao garçom depois que recebe a xícara com o cafezinho)
Hermes
___Já que o senhor reconhece a importância do professor Otto para Três Rios... acredito que não haverá problema nenhum em o poder executivo tomar a frente das homenagens póstumas. Obrigado! (Depois que recebe a xícara com o cafezinho)
Prefeito
(Depois de dar o último gole e colocar a xícara na mesa) ___Sem sombra de dúvidas... agora mesmo vou ligar para o presidente da Câmara Municipal, que é do meu partido e pedir-lhe que prepare todos os trames para as homenagens na Câmara Municipal.
Hermes
(Com a xícara nas mãos e demonstrando contentamento) ___Sabia que o senhor não ficaria indiferente para com essa história. A população de Três Rios ficará extremamente feliz com essa sua atitude.
CORTE
CENA 19
TAKE DA CIDADE DE TRÊS RIOS/EXT./TARDE
- A imagem parte do close do relógio da matriz que marca “15h30m”. Em seguida, a câmera mostra o carro de som anunciando pelas ruas da cidade o novo endereço em que está sendo velado o corpo do professor Otto: “A família do professor Otto Diniz comunica à população de Três Rios que o corpo do professor Otto Diniz está sendo velado na Câmara Municipal, de onde sairá o féretro para o sepultamento às 16h. A família enlutada agradece a todos os que comparecerem a esse ato de fé e piedade Cristã”. Em seguida, a câmera mostra, em close, a fachada da prefeitura com as bandeiras do Brasil, Estado e Município, hasteadas a meio palmo.
CORTE
CENA 20
FRENTE E FACHADA DA CÂMERA MUNICIPAL/EXT./TARDE
- Vêem-se, em plano geral, imagens do prédio da Câmara Municipal de Três Rios. A câmera mostra inúmeras pessoas em uma grande fila para se despedirem do professor Otto Diniz. E em off, dentro da câmera, ouve-se o discurso proferido pelo prefeito: “Três Rios está de luto. Como chefe executivo deste município, decretei três dias de luto oficial pela morte do já saudoso e sempre querido professor Otto Diniz...
CORTE

CENA 21
SALÃO NOBRE DA CÂMERA MUNICIPAL/INT./TARDE
- Vêem-se as pessoas admirando o corpo do professor Otto que está no caixão coberto com a bandeira do Brasil. Ao fundo, ouve-se a música “Ressuscita-me” instrumental. A viúva chorando, abraçada ao filho, Hermes e outras personalidades em volta do caixão ouvem atentos o discurso do prefeito.
Prefeito
___...A notícia do seu falecimento pegou todos nós de forma súbita e tristonha... Não posso deixar de citar o legado cultural e político que o professor Otto Diniz está deixando de herança para a nossa Três Rios. Dentro de poucos dias, estaremos inaugurando uma praça com seu nome, para que sempre... sempre ele seja lembrado. Muito obrigado! (Demonstrava uma falsa tristeza, pois, em todo o tempo do discurso, ele se comportou como um político preocupado com a reeleição e não, propriamente com homenagear o falecido.)
- Nessa hora entra o padre (de batina) se dirigindo a frente do caixão. Vendo o padre se aproximar, a viúva se assusta e vai falar com Hermes.
Cecília
___O senhor convidou o padre... Mas o Otto era ateu! Viveu e morreu ateu...
Hermes
___Calma, Dona Cecília, por que ninguém é totalmente ateu. Estou certo? Tenho certeza de que, em algum momento da existência do professor Otto, de uma forma ou de outra, ele procurou a Deus. Talvez mesmo, sem o perceber ele buscou a Deus. Todos os homens precisam de Deus, assim como Deus também necessita dos homens. Homens como o professor Otto, fazem falta lá no céu. Estou certo? A vida é uma troca, Dona Cecília... e Deus é o maior permutador. Estou certo? Agora, com licença, vou dar as boas vindas ao padre. (Hermes sai e vai ao encontro do padre. Nesse momento, ouve-se a música “Ressuscita-me” instrumental. Os dois se cumprimentam com um aperto de mãos.)
Hermes
___Obrigado por ter atendido meu chamado, padre, (Meio sem jeito) para fazer a recomendação do corpo do professor Otto... mesmo sabendo que ele era...
Padre
(Interrompendo)___Para Deus, todos nós somos filhos amados. Não importa para Ele que a gente se comporte como descrente. Deus é misericordioso, portanto receberá todas as suas criaturas de maneira igual...
Hermes
___Bem, a hora já se avança (Olhando pro relógio), vamos começar as orações. Estou certo?
Padre
(Na cabeceira do caixão com a tampa aberta) ___Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo... Diletos e amados irmãos: de Deus viemos, para Deus voltaremos... esta é, indiscutivelmente, a única verdade que temos na vida. Depois de cumprimos a nossa missão na terra... ganhamos como recompensa a contemplação da face de Deus. Não existe dádiva maior do que estar diante do Pai Celestial. Por isso, devemos celebrar com júbilo este momento em que nos despedimos do professor Otto que foi um homem, enquanto vivo na terra... ajudou os pobres e lutou para que todos tivessem os mesmos direitos. Descanse em paz, professor Otto Diniz. (Joga água benta sob o caixão e ordena que se coloque a tampa. Mais uma vez ouve-se a música “Ressuscitas” instrumental.)
- Na hora em que dois homens estão colocando a tampa no caixão, a viúva se abraça com o filho, os dois choram copiosamente. Mostra as pessoas enxugando as lágrimas com lenço ou com as mãos.
CORTE
CENA 22
CEMITÉRIO MUNICIPAL/EXT./TARDE
- Vê-se a inscrição do cemitério municipal na entrada. Em seguida, a imagem mostra uma pequena multidão em volta do túmulo do professor Otto Diniz. Quando o homem começa a empurrar o caixão, (A bandeira municipal está sobre o caixão) para entrar na gaveta, é interrompido com uma ordem.
Cecília
___Esperem um pouco... Tenho algo a dizer... Todos sabem (Chorosa) que sou Kardecista e, como Kardecista acredito piamente que, dentro em breve, o Otto estará em nosso meio novamente.
- Cecília chora de soluçar e é amparada com um abraço de Hermes, que toma a palavra.
Hermes
___A Dona Cecília tem razão... O professor Otto Diniz, sempre vai estar vivo dentro do nosso coração... por tudo que ele foi... e fez por Três Rios.
- Gullar, abraçado a Cecília, dá a ordem para colocar na gaveta o caixão. Vemos pessoas tristes, colocando flores sob o caixão.
CORTE
CENA 23
FRENTE DA CASA DA VIÚVA/EXT./TARDE
- Vê-se o carro chegando frente à casa da viúva. Primeiro, desce Hermes. Ele abre a porta do carona e desce Cecília (Vestida de preto); em seguida, desce Gullar (que logo acende um cigarro). Hermes segura a mão de Cecília e, com toda serenidade, fala com ela.
Hermes
___Até que tudo seja resolvido, para que a senhora receba a pensão deixada pelo professor Otto, a senhora Dona Cecília pode contar comigo para suprir qualquer necessidade que, por ventura, venha a ter.
Cecília
___Obrigada, senhor Hermes. O senhor demostrou ser dono de um coração generoso. Não sei o que seria da gente, se o senhor não tomasse a frente da situação. Acredito que até agora o corpo do Otto estava ainda ai (Apontando a casa). Não sei como pagar ao senhor por tudo que fez pelo Otto e por nós.
Hermes
___Já ganhei muito... ganhei a amizade de vocês... e o filme.(Ele vai até o carro e pega a fita de vídeo) Lembra a minha felicidade quando encontrei essa fita? “Deus necessita de homens”. (Close no título do filme) Bem! Quero reafirmar que pode contar comigo pra qualquer coisa.
- Hermes se despede e vai entrando no carro, abre a porta, quando é chamado por Gullar.
Gullar
___Seu Hermes, como meu pai, eu também sou ateu... mas eu sempre achei que qualquer um pode ser Deus... Basta fazer o bem, assim como o senhor fez pra gente... Muito obrigado, seu Hermes, por o senhor existir. (Ele volta e os três se abraçam de um só vez).
CORTE
CENA 24
SALA DE ESTAR DA CASA DE HERMES/INT./NOITE
- Sala ricamente decorada, iluminada somente pela luz do abajur, Hermes assiste o filme “Deus necessita de homens”, pela televisão. A imagem mostra o final do filme e, depois, a passagem dos créditos. Nesse momento, vê Hermes se levantando da poltrona (De pijama), vai até o aparelho de vídeo e rebombina a fita. Entra na sala a mãe de Hermes (Uma senhora gorda) com um copo de suco na bandeja para Hermes e comenta.
Mãe de Hermes
___Meu filho... você vai assistir de novo a esse filme? Essa é a terceira vez consecutiva, que você assiste “Deus necessita de homens”, só nesta noite.
Hermes
___Estou matando a saudade, minha mãe. Vi esse filme no seminário... pela primeira vez quando tinha onze anos... e me emociono até hoje.
- Hermes se senta no sofá com a mãe, dá um beijo nela, na cabeça, e carinhosamente fala com a mãe.
Hermes
___Agora, sente aqui. A senhora vai assistir comigo. (Recebe o copo de suco e dá um gole)
- Aparece na televisão o título do filme “Deus Necessita de Homens”.

FIM

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

POESIA: PREFEITO GUERREIRO

Esta poesia e dedicada ao intelectual, jornalista e escritor Fernando Gabeira.
Gabeira é o melhor para administrar o Rio
honesto, competente e ético
seu histórico é rico
de luta pela liberdade
ele ama demasiadamente
essa maravilhosa cidade.
Meu voto é para Gabeira
porque quero ver
minha cidade ser bem administrada.
Não quero ver o Rio sem rumo
fora dos trilhos.
Rio
nosso cartão-postal brasileiro.
Gabeira
nosso prefeito guerreiro.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

POESIA - POLÍTICOS VERSUS VOTOS

O voto
cuidado para não votar contra você.
O voto é sua bandeira democrática
é sua escolha, é um dever.
Quem vota por troca de favores pessoais
perde o direito de reclamar seus direitos
e amarga uma longa estrada deserta:
sem escolas, sem cultura
sem segurança pública, sem saúde pública
sem emprego, sem moradia.
O voto
quando consciente
dado a político decente
se transforma em benfeitoria pública.

domingo, 28 de setembro de 2008

POESIA - PERSONNALITÉ

Robort Rose
personae gratae
de extensão sabia.
Vê-lo em pleno exercício
a decifrar as personalidades
mostrando a diVERsidade da cidade
pela TV
se aprende a lição do saber.
De bom gosto impecável
e com esmerada educação
sua finesse
traduz sua própria personnalité.
Este poema e dedicado ao mestre Robert Rose, que em breve estará apresentando o seu programa televisivo: "Personnalité".

sábado, 27 de setembro de 2008

CONTO - EM NOME DOS HOMENS

Este conto foi escrito em 1991.

EM NOME DOS HOMENS

João Lucas, filho da tradicional família Feitosa de Brito, tinha amanhecido com a idéia fixa. Decididamente, depois do almoço ele deixaria o Seminário-Maior de Teologia São Jerônimo. Após passar a noite toda em claro, meditando, chegou à conclusão: “Aqui, quanto mais se reza, mais coisas erradas os seminaristas praticam”.
O Padre Reitor, recebeu a notícia da desistência vocacional de João Lucas, com imensa tristeza. Não só por perde seu melhor aluno de teologia dogmática, matéria lecionada por ele, como também por perder a alta contribuição financeira, que a rica família de João Lucas depositava mensalmente em favor do seminário. Em vão o Padre Reitor, tentou a todo custo fazer seu dileto aluno dissuadir da idéia de ir embora.
Antes do almoço, o Padre Reitor reuniu todos os seminaristas na capela, e fez o anúncio que João Lucas estava deixando o seminário. O seminarista Vidal, ficou em pranto, pois era ele quem ganhava as roupas e sapatos de João Lucas, quando não mais queria usá-los. Chorou copiosamente. Fizeram uma fila, para que cada seminarista se despedisse, dando um abraço em João Lucas. Primeiro a abraçar foi o Padre Reitor, que fez uma declaração ao pé-de-ouvido do já ex-seminarista: ___ Você tinha tudo para ser um bispo. É inteligente e sua família tem posses.
Enquanto recebia os braços e cumprimentos, João Lucas lembrou do muito que apontou durante os quase seis anos vividos naquele seminário. Os votos: castidade, pobreza e obediência, ele nunca os viveu. Quando cursava o 3º ano de Filosofia, João Lucas e outro seminarista foram para á Praça Fausto Cardoso, reduto de meretrizes e michês, lá sentiram pela primeira vez o gozo, proporcionando pelas experimentadas mulheres de “vida fácil”. Pecando assim, contra o voto de castidade. O outro seminarista, que acompanhou João Lucas na noitada de prazeres carnais, foi julgado, condenado e expulso do seminário, sem direito de defesa, já João Lucas somente recebeu orientação do Padre Espiritual, para não mais cair em tentação. A luxúria era o forte de João Lucas, tinha ele seu próprio carro no seminário, usava só roupa de marcas e esbanjava a gorda mesada, que ganhava dos pais, comprando coisas supérfluas e freqüentando restaurantes de cardápios caros. Pecando assim, contra o voto da pobreza. Certa vez, Caetano Veloso, veio fazer um show na cidade, sendo João Lucas fã incondicional do cantor e compositor baiano, ele não mediu esforços para ver seu ídolo de perto. Depois de ser proibido de sair do seminário naquele dia, pelo Padre Reitor, contrariando as ordens do seu superior, não houve outro jeito, se não o de João Lucas pular o muro de cinco metros do seminário, para assistir ao show do autor de “Podres Poderes”. Pecando assim, contra o voto da obediência.
Tudo estava consumado. Alguns seminaristas ajudaram carregar as malas até o carro de João Lucas, que sem olhar pra trás, saiu em alta velocidade.
Quando chegou a casa dos pais, explicou o porquê da sua decisão de abandonar o seminário:

___ Lá é um lugar que tanto forma, como deforma.
Disse isso cabisbaixo. O pai de João Lucas lhe deu todo apoio, a mãe mostrou descontentamento com o acontecido. Tinha ela muito orgulho em dizer para as amigas, que seu filho era seminarista. Teólogo!
Aproveitou a reunião familiar e comunicou que iria morar no Rio de Janeiro, no apartamento da família, na Rua Marquês de Olinda, em Botafogo. Queria João Lucas investir na sua nova vocação, a de roteirista. Argumentou com os pais:
___ Nasci para escrever roteiros para cinema, é minha verdadeira vocação. Sou um homem para as letras, não para o altar.
E mostrou aos pais a sinopse de um filme de sua autoria, intitulado: Em nome dos Homens:
___ O filme tem como plot principal, a história de um padre que assume a homossexualidade durante a homilia, na missa de domingo!
Enfatizou João Lucas Feitosa de Brito.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

POESIA - COPACABANA: DENSA E OBSCENA








A vida
densa e obscena
tal qual a noite na Avenida Atlântica.
Copacabana de sonhos extraviados
de meninos e meninas de vida-fácil e
indomesticáveis.
Território habitado por gênios e doidivanas
onde compra-se e vende-se
contemplação de frente para mar.
Os ofídios estampados no calçadão
são geometrias do desejo oculto
de cada sexo disputado
dos cachês cobrados.
A polícia desonesta
não espera amanhecer
usurpar quem labuta
fere quem nada dar
implanta a droga no bolso
para condenar.
Copacabana sinônimo de mar.
Navegar neste mar-aberto
tende-se a naufragar
independentemente da beleza ímpar
de Copacabana.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

POESIA - AFLUENTE DESTINO


Na enorme casa do lado esquerdo do Paraíba do Sul,
escreve-se notícia verossímil.
Os cachorros a ladrarem insistentemente ao vento,
correndo atrás das lagartixas, que passeiam sorrateiramente
sobre muro alto que encobre a casa.
Diante do oratório, abarrotado de imagens sacras,
faço as orações,
peço perdão por tudo que fiz, faço e farei.
Não vou deixar de pecar, pois se constrói o homem
tendo como base o pecado.
Tenho de cima do terraço da casa uma visão privilegiada,

vejo o Rio Paraíba do Sul desaguando seu destino,
assisto a chegada e a partida de pessoas aglomeradas
que buscam esperança do outro lado do Paraíba do Sul.

sábado, 6 de setembro de 2008

POESIA - QUEIMA SANGUE

O pacto feito de sangue derramado, na encruzilhada por homem transformado.
Baralho dividido em partes iguais, para conquistar as forças sobrenaturais.
Não há poder fora de Oró, não se encontra alegria longe de Kinó porto seguro de Miró.
Livro aberto exposto em vitrine, lançado em oratório para jejuar lagrimas na marine.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

CONTO - A SOMA DOS PERDIDOS

Este conto foi escrito em 1991 e faz parte do meu livro As Dores do Mundo.

A SOMA DOS PERDIDOS
Quase nada sabia-se da vida do Professor Dr. Marcus Aureno. Que ele lecionava Anatomia Humana, na Faculdade de Medicina Sameiro, na Rua Sorocaba, em Botafogo, todos sabiam. Também que ele morava, na Rua Prudente de Morais, em Ipanema, todos tinham conhecimento. Mas o que pouquíssimas pessoas, tinham informação, é, que ele era homossexual enrustido.
Os jornais cariocas, amanheceram trazendo a mesma manchete: - MÉDICO CONCEITUADO DEPOIS DE MATAR GAROTO-DE-PROGRAMA SE ENTREGA A POLÍCIA. Seus amigos, colegas de profissão e todos que o conheciam, ficaram atônitos com a notícia. Pois o Professor Dr. Marcus Aureno, 40 anos, solteiro, natural de Vitória do Espírito Santo, porém desde os sete anos de vida morava no Rio de janeiro. Era ele unanimidade, no que se dizia em respeito ao caráter, inteligência e bondade.
Em depoimento ao delegado, o médico narrou sua história em um monólogo.
Tudo começou quando eu conheci Lauro, na Rua da Constituição, esquina com a Praça Tiradentes, ele estava em frente de um ateliê que faz todos os tipos de tatuagens. Não sei porque, ele olhou para mim, e perguntou-me, se eu pagaria para que o tatuador fizesse uma bonita tatuagem no seu braço. Como médico, quis mostrar-lhe os danos irreparáveis que uma tatuagem, pode trazer à vida de uma pessoa. Conversa vai conversa vem. Quando dei por mim, estávamos sentados à mesa de um barzinho na Rua Imperatriz Leopoldina, onde ouvia-se músicas de Roberto Carlos, repetidas vezes, só “As flores do jardim da nossa casa”, ouvi quatro vezes. Ele contou-me que tinha 23 anos e recentemente havia chegado na cidade, vindo de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, e ganhava dinheiro fazendo programas com mulheres. Não negarei que aquela conversa deixou-me excitado, a beleza dele era encantadora e sua presença fazia com que eu criasse fantasias na minha cabeça. De imediato convidei-o para dormir no meu apartamento, sem pestanejar ele aceitou o convite e disse que já não suportava mais dormir nos hotéis de quinta categoria da redondeza. Seus olhos infinitamente azuis, mereciam coisas melhores. Concluiu ele, se narcisando diante do enorme espelho na parede do barzinho. Ao chegarmos no meu apartamento, percebi nos seus olhos, o deslumbramento que o ambiente estava lhe causando. Após o jantar a luz de velas, nos entregamos um ao outro. Depois do ato de intimidade, ele se ofereceu para pegar algo para nós bebermos, no bar da sala. Como estava ele demorando por demais resolvi ir atrás dele, para minha maior surpresa, ele estava revirando toda a sala em busca de jóias e dólares. Assustado com a minha presença, com uma faca na mão ele começou a me ameaçar, aquela cena deixou-me completamente entontecido. Tomado por alguma força, que eu próprio desconhecia dentro de mim, comecei a travar com ele uma luta corporal. E o fim da história, o delegado já conhece, durante a luta ele tentou me empurrar pela janela do oitavo andar, onde moro, e o feitiço virou contra o feiticeiro. Ele foi e eu fiquei pra contar a história.
No julgamento, o Professor Dr. Marcus Aureno foi absolvido. A morte do garoto-de-programa, não houve culpabilidade por parte do médico, sentenciou os jurados.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

POESIA - SOMBRA NA PAREDE

Quero este amor, assim como existe a minha vida, meus sonhos,
minhas atitudes desgovernadas!
Arrasto para dentro de mim, a sombra desbotada na parede
com o intuito de engolir o que foi-me oferecido.
Nada possui a definição do instante codificado do êxtase.
Não se traduz a leveza, nem tão pouco as primícias,
do fruto regado de prazer.

domingo, 24 de agosto de 2008

CONTO - BIOGRAFIA DE UMA PAIXÃO

BIOGRAFIA DE UMA PAIXÃO - Conto escrito em 1988.

Todos tinham conhecimento, sem exceção, inclusive o Cardeal Metropolitano do Rio de Janeiro, de que a verdadeira vocação do diácono Ailson Fontes não era o sacerdócio mas sim a de ser jogador de futebol. Para ser mais preciso, ser goleiro. Sua técnica infalível de defender o gol rendeu-lhe uma matéria de página inteira no caderno de esportes do jornal O Globo. A manchete trazia o seguinte título: “As Mãos Protetoras do Goleiro de Deus”. O que mais instigava a todos era saber que o diácono Ailson recusou um rico contrato para jogar em um time de grande porte da capital fluminense.
Após oito anos ininterruptos estudando Filosofia e Teologia no Seminário São José, no bairro do Rio Comprido, finalmente chegou o dia da ordenação sacerdotal do diácono Ailson, na Catedral de São Sebastião do Rio de Janeiro.
Pontualmente, às 10h daquele domingo de sol abrasador, adentrou na Catedral Metropolitana um exército clerical: seminaristas, diáconos, bispos-auxiliares e Sua Eminência, o Cardeal, que presidiria a cerimonia religiosa. Todos paramentados liturgicamente se dirigiram ao presbitério sob o imenso tapete vermelho. Logo atrás das autoridades eclesiásticas, vinha uma legião de mulheres, pertencentes a diversos organismos da Santa Madre Igreja: Apostolado da Oração, Filhas de Maria e Cruzada Eucarística; todas traziam bandeiras bordadas com as insígnias das respectivas confrarias. A entrada das carolas na igreja-mãe da Cidade Maravilhosa foi coreografada. Os passos e os movimentos feitos com as bandeiras eram sincronizados, milimetricamente corretos, tais procedimentos faziam lembrar uma festa de abertura da Copa do Mundo em estádio lotado.
Durante toda a celebração, desde o intróito, o diácono Ailson, sempre com o olhar opaco, fixou os olhos na mãe, que estava sentada na primeira fileira de bancos. Dona Mara, moradora de Campo Grande, Zona Oeste do Rio de Janeiro, viúva e pensionista da Marinha do Brasil, mãe de um único filho, fez de tudo para vê-lo padre. Chantagem emocional era o principal artifício para mantê-lo no seminário.
Com o término da celebração, o, agora, padre Ailson Fontes se dirigiu à genitora e, diante de todos os presentes despiu suas vestes litúrgicas: casulo, estola e a túnica. Entregou-as para a mãe. Com a voz embargada e os olhos lacrimejados disse-lhe.

___ Agora cumpri o que havia prometido à senhora e ao meu pai, antes dele morrer: sou padre da Igreja Católica Apostólica Romana. Não era isso que vocês queriam? Que eu fosse Padre? Promessa feita, promessa cumprida. A partir de agora, vou atrás da minha verdadeira vocação.

___ Não faça isso, meu filho amado, eu já estou velha e cansada, não agüentaria viver com esse desgosto.

Por mais que dona Mara tentasse dissuadir o filho da idéia de abandonar o sacerdócio, minutos depois de ser ordenado, não teve êxito. Padre Ailson saiu da Catedral em disparada, correndo pela avenida Chile sem olhar para trás. Defronte do Teatro Nelson Rodrigues, o neo-sacerdote deu sinal para um táxi, quando este parou, ele entrou e pediu uma corrida para Laranjeiras. Para ser mais preciso, seu destino era a Sede do Fluminense Football Club.

domingo, 17 de agosto de 2008

PALAVRADOR E FILÓSOFO MINEIRO

O palavrador mineiro, João Guimarães Rosa, foi antes de tudo um filósofo por natureza. Da sua prosa pode-se extrair, além de excepcional narrativa, também, ensinamentos preciosos e enriquecedor para o nosso dia-a-dia. O fascínio começa a partir do universo sertanejo, onde se encontra a filosofia existencial, calcada na visão do homem simples que aprendeu a enxergar o óbvio. Através do linguajar matuto do sertanejo-personagem, estar de forma explícita o entendimento: De onde veio o homem e para onde caminha a humanidade? A vida é unicamente para ser vivida? Existe compreensão para inconstância da vida? As respostas são incididas no contexto da vivência, e, a síntese da existência humana é delineada na fala do sertanejo-personagem criador por Guimarães Rosa. _ “O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

O MUNDO AO DEUS DARÁ


O mundo está mesmo de cabeça para baixo. A cada dia recebermos uma enxurrada de informação desumana. E o, pior nós estamos enxergando as barbáries com naturalidade! O estágio de vida, que ora, nos encontramos, é exatamente o contrário que propagou o bem amado santo da ternura maior: São Francisco de Assis.
Senhor, transformai-me em um escroque.
Onde houver ódio, que eu cometa uma carnificina.
Onde houver ofensa, que eu leve um tresoitão para matar quem me ofendeu.
Onde houver discórdia, que eu plante mais desgraça até concluir o extermínio.
Onde houver dúvida, que eu dissimule até convencer que a minha mentira, é verdade.
Onde houver erro, desde que não seja praticado contra mim, que eu faça vista grossa.
Onde houver desespero, que eu dê o tiro de misericórdia.
Onde houver tristeza, que eu leve a notícia fúnebre.
Onde houver trevas, que eu mande quebrar as lâmpadas dos poucos postes que ainda tem luz, para que enxergue somente o breu.
Há quem diga que este mundo foi vendido a Lúcifer, assim como tem gente que vende a própria alma. O mundo foi vendido por uma ninharia irrisória, Já que seu Criador desistiu de reformá-lo. Uma fez que, construir outro, sai mais em conta. Portanto, é cada um por si, e o Criador contra todos. Está na bíblia, no livro do Deuteronômio: - "É olho por olho, dente por dente".

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

CONTO - TRASNFIGURAÇÃO DO ONTEM

Este conto foi escrito no dia 07 de janeiro de 2002.

TRASNFIGURAÇÃO DO ONTEM
Havia mais de três horas que eu estava em um cubículo, onde eles chamavam de sala de interrogatório. O local com uma luminosidade quase inexistente tinha um aspecto de algo tenebroso, causando-me assim a sensação de que não sairia vivo dali.
Recebi ordens em tom de agressividade, dada por um negro de aproximadamente 45 anos, que tirasse meu hábito, pois a partir daquele momento eu seria tratado como homem comum, não mais como padre. Exigiu ele, que eu ficasse totalmente despido: “Se possível tire a roupa também da vossa alma, seu padreco vermelho safado.” Disse estas palavras após notar minha rejeição contrária a suas ordens.
A cada pergunta não respondida por mim, hora eu era ameaçado, hora eram aplicados tapas em meus ouvidos, na gíria essa prática é conhecida por “telefone”. Num dado instante quis saber a razão pela qual estava detido e o motivo de tantas perguntas.
__ Você sabe, se esconde atrás dos muros do convento e da batina para desestabilizar a ordem nacional . Você e outros da sua laia são todos desordeiros, comunistas, veados e subversivos, por isso todos vocês devem ser banidos da face da terra.
__ Eu tenho meus direitos como cidadão. __ Tentei intimidá-lo.
__ Direitos. Que direitos ? Ouvi um riso sarcástico, ele colocou seu rosto bem junto ao meu, senti um hálito de alguém que bebeu algumas doses de conhaque, depois de me dar uma bofetada olha nos meus olhos e fala.
__ Olha aqui seu filho de uma ronca e fuça, nós estamos sabendo que vossa reverendíssima (com deboche) esta panfletiando na sua sacristia um jornaleco chamado “A Força dos Excluídos”, provocando com isso uma anarquia, ainda vem me falar de direitos.
__ De fato eu adquirir alguns exemplares do citado jornal, mais com único objetivo de ajudar as famílias dos presos políticos. Há crianças e mulheres passando fome, o jornal tem o intuito de arrecadar dinheiro para os familiares.
A minha declaração só fez aumentar a raiva do meu algoz, chegando ao ponto dele colocar o revólver na minha boca enquanto uma terceira pessoa que acabara de entrar no recinto surrava-me com uma toalha molhada, prática usada para não deixar lesão corporal, tamanha era a dor que senti a urina descer pelas pernas.
Depois da surra dada em consequência, segundo eles, da minha insolência em admitir tal respaldo às famílias dos presos políticos, jogaram um balde com água gelada sobre mim em seguida ligaram o ventilador, era costume tal coisa para que o preso pegasse pneumonia e morresse, livrando-os da responsabilidade da morte do detido.
Usaram e abusaram da autoridade covarde que eles tinham sobre minha pessoa. As torturas psicológicas e físicas eram sem limites: roleta-russa, ponta acesa de cigarros apagados na sola dos meus pés, a todo momento falavam que iriam introduzir uma chave de fenda no meu ânus e que eu não sairia vivo dali se não colaborasse com a denúncia, apontando outros padres e bispos que também estavam acolhendo em suas paróquias e dioceses familiares de presos políticos.
As forças já haviam me abandonado, eu não mais raciocinava com clareza, aproveitando isso eles obrigaram-me a assinar papéis inocentando-os de qualqueis danos, em seguida desfaleci. Acordei com um banho de água gelada e recebi a permissão de ligar para o convento solicitando que alguém viesse buscar-me. Meu Superior não deu autorização para que um confrade fosse me tirar daquele inferno. Vestiram minhas roupas e colocaram-me em um táxi, pagaram a corrida antecipadamente ao taxista, e o negro principal torturador se dirigiu a mim.
__ Não esqueça de rezar por mim seu Padre, pois sei que no fundo, no fundo, o senhor está agradecido por não lhe ter tirado a vida.
Nada lhe respondi estava completamente desorientado, tudo ofuscava a minha razão: as dores, os medos e a incerteza gritavam de forma desumana em todo meu ser.
Chegando no convento, mal podia me segurar em pé fui de imediato aparado por dois confrades, o Superior ao me ver foi de uma insensibilidade que assustou a todos os presentes profundamente.
__ Lavo minhas mãos diante dessa situação, Padre, pois diversas vezes lhe alertei sobre os perigos desse caminho que o senhor se veredou. O que eu podia fazer já fiz, aqui está a passagem somente de ida para França. Tome um banho, faça sua mala e coma alguma coisa, depois vá para o aeroporto, seu vôo sai daqui a duas horas. E, Padre, ouça bem esse conselho que vou lhe dar, esqueça que o Brasil existe e seja feliz na sua nova pátria.
Hoje vivo recluso em um convento em Alençon, norte da França, onde exerço a função de mestre de noviciado. As marcas das torturas sofridas estão vivas em mim, tenho vários problemas de saúde em consequência do que passei. Do Brasil recebo periodicamente notícias por correspondências através dos meus familiares e confrades. Demais rezo pelo os que mal fizeram a mim para que Deus acolha todos na sua infinita misericórdia.

sábado, 2 de agosto de 2008

POESIA - AGOSTO NÃO TEM FIM

AGOSTO NÃO TEM FIM

Seus dias se arrastam
como não houvesse amanhã.
As fileiras intermináveis sobre a sombra do desgosto
escondida entre as palmas das mãos.
Não dá para ser preciso em agosto
pois não faz sentido gerar os dias em incubadora solitária.
Minuciar as horas estendidas
no varal do tempo sem vento,
sem roupa, sem verdade excepcional.

Traz notícias inventadas, o periódico
relata o último capítulo da cena final.

quarta-feira, 30 de julho de 2008

POESIA - ACIMA DO ILUSÓRIO

Reconstruir os parapeitos
acima da altura menor.
Não requerer certidões negativas
sob qualquer suspeita.
Convocar reunião extraordinária
para dizer coisa com coisa e
emprenhar ouvido mouco.
Arrastar as sandálias nas trilhas
até fazer clarão na mata virgem.
Se perder meio a um vazio
de um tempo qualquer,
para não encontrar o que havia perdido.

domingo, 29 de junho de 2008

POESIA - CHICLETE DE MARESIA

CHICLETE DE MARISIA

Estou em pleno ar (dentro de um helicóptero),
ando sobre as águas do mar (dentro de um navio).
Corro os riscos das turbulências,
navego em cima da proa.
Risco o piso do jardim de inverno móvel
como se não existisse vigilância.
Mastigo e cuspo chiclete de maresia
que recria os ventos francos e tempo nublado,
me entregando, de mão beijada as tormentas marítimas.

terça-feira, 10 de junho de 2008

POESIA - DIA DO NAMORADO

NESTE 12 DE JUNHO
LEVAREI MINHA AMADA PARA JANTAR NO RESTAURANTE CALOUSTE GULBENKIAN.
ELA MERECE. ESTE RESTAURANTE É O MAIS CARO, E O MAIS BONITO DA ZONA SUL.
A MINHA NAMORADA TAMBÉM É A MAIS BONITA, DE TODAS AS NAMORADAS.
NÃO SE ENXERGA BELEZA IGUAL. BELEZA RETRATADA NOS QUADROS DE PINTURA A ÓLEO DO MUSEU DE PORTUGAL.
RELUZENTE, ATRAENTE EXPOSTA PARA QUEM QUISER VÊ.
MAS ELA É SOMENTE MINHA!
ELA SUGA MEU DESEJO, ME SATISFAZ NOS MOMENTOS A SÓS,
SABE ME CONDUZIR AO AUTO DO PRAZER.
CONTUDO, SEU CONTEÚDO É OCO.
DESNECESSÁRIA PALAVRA, POIS ELA CARREGA EM SI A GARGANTA PROFUNDA.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

POESIA - LARGO, VASTO E PROFUNDO

Correu demais e recebeu de brinde a frustração.
Brincou demais e nada ficou comprovado entre a verdade e a mentiria.
A sua agrura enrustida se pôs a olhos nus
No capítulo de ontem, porém nada foi dito, nada foi mostrado.
O cala-se a boca sobressaiu de forma devastadora, arrastou multidões,
Que enfurecida cobrou o quinhão penhorado.
Largo, vasto e profundo o desejo de matar,
De quebrar a cara no mundo, de onde não se tem notícias do lado de lá.
Parar de enxergar o que não existe
Dormir em cimento armado para se proteger
Construir cidadelas no âmago das entrelinhas de cada ser.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

CONTO - O MENINO PRODÍGIO E A PROSTITUTA APRENDIZ

ESTE CONTO FOI ESCRITO EM PROPRIÁ-SE, EM 1989.

O MENINO PRODÍGIO E A PROSTITUTA


Todos os dias, após o término das aulas, por voltas das 12:30hs., os alunos do Colégio Diocesano de Propriá, saiam desembestados: correndo, gritando e fazendo arruaça. Dentro dos quase duzentos alunos, existia um grupo, formado por doze meninos que se desatacava dos demais alunos. Liderado por Ulisses, o grupo dos doze, como era conhecido, sempre ia depois da aula, para a Rua da Catedral, rua paralela a do colégio, com o intuito de fazer provocação a D. Nancy.
D. Nancy, uma ex-prostituta, beirando a casa dos 65 anos, que não dava mais expediente, se via agoniada com aquele bando de meninos, entre 10 e 14 anos, fazendo gestos obscenos falando palavrões na porta da sua casa. Tal comportamento vil dos alunos foi por varias vezes denunciado à direção do colégio, esta, não tomou nenhuma providencia, uma vez, que a denunciante era uma rameira, uma quenga em fim de carreira. Tudo bem, que ela não atendia mais homens. Todavia, uma vez prostituta, sempre prostituta. Era assim que os medíocres da sociedade propriaense enxergavam.
Pertencia ao grupo dos doze, o inteligente Roger, apesar de fazer parte da trupe, Roger não se envolvia diretamente com as brincadeiras de mau gosto dos colegas inflames. Percebendo que o garoto não tinha o comportamento igual aos outros meninos, D. Nancy frisava bem sua fisionomia e procurou obter informações sobre Roger.
Certa feita estava Roger na feira com sua mãe, quando se deparou com a sexagenária mulher parada em sua frente. O menino assustado perdeu a cor e o chão.

___ Roger! É este seu nome, não é?

___ A senhora conhece meu filho de onde?

___ Eu moro perto do Colégio Diocesano que ele estuda. Não só conheço ele, como os outros coleginhas dele.

___ Ah! Cumprimenta... qual é sua graça?

Roger, que segurava o carinho de feira cheio de frutas e hortaliças, termia feito vara verde, com medo que sua genitora descobrisse que estava conversando com uma ex-mulher de vida fácil em via publica.

___ Cumprimenta a D. Nancy, meu filho.

___ Bom dia, D. Nancy!

___ Bom dia, Roger! Tive conhecimento que você é um menino de muita sabedoria.

___ Meu Roger é de fato um menino prodígio. Estudioso por demais. Até aula de língua estrangeira ele dar para os colegas.

___ Sei disso. E é por isso que eu quero contratar-lo para ensinar-me língua estrangeira.

___ A senhora com essa idade, querendo aprender. Acho muito bonita essa sua bravura. Mas que mal lhe pergunte D. Nancy, para que a senhora que aprender língua estrangeira?

___ É que tenho um filho morando nos stentes. E pretendo um dia visitar-lo... E então rapazote aceita ou não me dar aulas?

___ Eu não disponho de tempo suficiente, para assumir este compromisso com a senhora.

___ Como não, meu filho. Você tem nota máxima em todas as matérias. Deixe de modesta Roger meu filho. Vamos, aceite dar aula para D. Nancy.

___ Mas mãe, eu acho melhor não...

___ D. Nancy pode ficar tranqüila o Roger vai ensina língua estrangeira para a senhora. E além do mais, quem ensina também aprende. Quando a senhora quer que ele comece as aulas?

___ Se possível hoje mesmo, das 16:00hs. as 17:00hs.. Tá bom pra você Roger?

___ Pra mim tudo bem. Se a mamãe concordar.

Ao chegar em casa Roger se trancou em seu quarto. Preferiu silenciar sobre quem na verdade era D. Nancy. Sua mãe eufórica com o reconhecimento da sabedoria do filho, fora do convívio familiar, ligou para São Paulo dando a boa-nova a filha, irmã de Roger, moradora da capital paulista.
Na hora marcada Roger estava em frente à casa de D. Nancy, com alguns livros debaixo do braço. Após dá sinal da sua chegada com o toque da campanhia a ex-cortesã abriu a porta e o mestre-mirim adentrou na casa. Meio amedrontado com o imponderável, Roger tremulava não conseguia conter o nervosismo nítido no seu semblante. Sua voz era quase incompreensível tamanha era a gagueira provocada pelo medo.
D. Nancy pegou o professor pelo braço levando-o para a sala de estar, sentados o mestre-mirim começou a dar sua primeira aula de inglês àquela que mal sabia assinar o próprio nome. Depois da quinta aula, Roger não já tinha mais o olhar amedrontado, sentia até uma certa paz naquele ambiente acolhedor. Roger era um menino muito observador e não deixava de reparar como a casa de D. Nancy estava sempre limpa e tomada por agradabilíssimo cheiro. Também ele observou que na casa tinha várias imagens de diversos santos católicos.

___ D. Nancy, porque a senhora tem tantas imagens de santos. É promessa?

___ Meu pequeno mestre, uma mulher feito eu, com a minha idade, não acredita mais em milagres. Essas imagens são as únicas companhias que eu tenho na vida. São com elas que eu converso, que rio e que choro.

___ Por que a senhora não vai morar nos Estados Unidos com seu filho, já que a senhora sente-se tão sozinha.

___ Foi bom você falar sobre isso meu professorzinho. Eu não tenho filho no estrangeiro e nem em nenhuma parte do mundo. No mundo eu sou sozinha, só tenho Deus por mim!

___ Então porque a senhora quer aprender a falar inglês?

___ Calma! Eu vou explicar tudo a você.

___ Espero que não seja nada impróprio para menores de 18 anos.

Os dois riram, pois o tempo criou entre eles laços de amizade.

___ Não, não tem, nada de desavergonhado. O que vou lhe contar, não lhe disse antes com medo que você me rejeitasse, preferi fortalecer nossa amizade e mostrar a você, que mesmo sendo uma ex-prostituta, sou uma pessoa respeitável e, não uma devoradora de homens como as pessoas me apontam na rua.

___ A senhora sempre mim tratou como uma mulher de princípios D. Nancy, mas a senhora ainda não respondeu, porquê quer aprender inglês se não vai aos Estados Unidos?

___ Eu contratei seus serviços como professor de língua estrangeira, para que você faça uma coisa por mim.

___ Do que se trata?

___ Um minutinho, vou pegar algo para você dar uma olhada.

___ A senhora está me assustando D. Nancy.

___ É disso que estou falando.

___ Este é o prospecto de um curso de inglês por correspondência!

___ Mas aonde eu entro nessa história D. Nancy?

___ Vou lhe dizer meu filho o quanto eu preciso de você para realizar um sonho. Acredito que este é o único sonho que carrego dentro de mim desde da meninice.

___ Se tiver ao meu alcance, vamos realizar-lo. Mas pare de chorar, por favor, se não vou chorar também.

Disse isso depois de se levantar, abraçar D. Nancy e enxugar suas lágrimas.

___ Então professorzinho, o meu sonho é ter um diploma com meu nome escrito: Nancy Maria Meira. No dia em que isso acontecer vai ser um dia de glória na minha vida.

___ Já entendi o que realmente a senhora quer que eu faça. Quer que eu responda os exercícios do curso de correspondência para a senhora receber o diploma. Não é isso amiga?

___ Que bonito que você me chamou de amiga, há muitos anos não ouvia ninguém me chamar de amiga. Obrigada meu filho. Amigo mestre, você vai ajudar-me nessa façanha? Talvez você ache tolice minha querer um diploma de língua estrangeira, não importa do que seja, o importante é o diploma. Tê-lo é como eu ganhar uma vida nova, enterrando meu passado de vida de mulher de vida fácil.

Enquanto D. Nancy falava Roger passava os olhos nos exercícios e respondendo algumas questões.

___ D. Nancy, posso lhe garantir que a senhora tem 99,99% de chance de ser diplomada. Hoje mesmo faremos a devolução dos exercícios devidamente respondidos para a central de cursos por correspondência e segundo o regulamento aqui, dentro de quinze dias a senhora receberá o diploma se obter 80% de respostas acertadas.

___ É claro que vou ter a nota máxima, pois é você meu prodígio mestre que vai responder.

Demonstrando muita felicidade D. Nancy se derramou em elogios e agradecimento ao seu mestre-mirim. Naquele mesmo dia, D. Nancy foi aos correios postar o envelope com as lições feitas do curso. Em seguida se dirigiu ao cartório onde fez um testamento. Passados quinze dias D. Nancy, como havia sido previsto por Roger, recebeu o seu tão sonhado diploma. Não se cabendo de alegria, ligou para o seu professorzinho para dar-lhe a boa nova. A mãe de Roger disse que o filho ainda não havia voltado do colégio. D. Nancy aproveitou para ir a vidraçaria na Rua Dom José Castro, mandou colocar o diploma na mais cara moldura. Ao sair da vidraçaria, D. Nancy, que não parava de contemplar o diploma não viu, no primeiro momento, quando um táxi em alta velocidade se aproximava dela, percebendo, a sua primeira reação foi de proteger o quadro com o diploma. O diploma ficou intacto, já D. Nancy não suportou o impacto com o táxi e veio a óbito.
Logo depois do sepultamento descobriu-se que D. Nancy, fez Roger seu herdeiro universal.

sexta-feira, 25 de abril de 2008

POESIA DUAS VEZES POESIAS

A AMBIGUIDADE DAS CORES

As cores não são sinais
elas são pontos indiciáveis da visão.
São elas viajens imagináveis
do desejo implícito descrito nos olhos.
Suas formas são abstratas
desenhadas na direção contraria do que se vê.
A diversidade opaca das cores
muda a ambigüidade de quem a vê
pela óptica do sistema inacabado.



AVANÇADO ESTADO DE DECOMPOSIÇÃO


As pedras rolaram
Soube os pés
E soterraram o corpo inerte.
Sufocado pela agoniação da falta de ar
Retorceu-se no cubículo espaço físico.
Um punhado de terra entrou
Na boca rígida entreaberta
E escorregou pela garganta costurada.
Os vermes passeiam sobre a fria carne
Gunindo em forma de gás sulfídrico
Exposto á intempérie putreficado.
A matéria orgânica
Desencadeiam os restos mortais
E desintegram o que não tem mais vida.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

POESIA - INCUMBÊNCIAS

Não vou tripudiar em cima dos cardáveis,
deixem isso para os abutres
das terras dos homens incrédulos.
Hoje beberei o vinagre,
oferecido no banquete das serpentes
enroladas nos pescoços invertebrados.
Atravessarei a maré da agonia
com a cabeça exposta na embarcação
feita de sal para dilacerar as feridas,
e maldizer o ventre que gerou a dor.
As asas cortadas
não suportaram ao peso do meu corpo
fardo de outras vidas, vidas esquecidas.
Retirara das suas incumbências
meu rosto transfigurado, minhas vestes rasgadas
e as nocivas lembranças de outrora.

segunda-feira, 21 de abril de 2008

CONTO - LAÇOS DE AMIZADE

Conto escrito em 21/04/2000.


LAÇOS DE AMIZADE

Assim que chegou à Rodoviária Novo Rio, Emílio foi direto ao guichê da Empresa de Ônibus Sameiro que detinha o direito da linha: Propriá – SE / Rio de Janeiro – RJ. A atendente confirmou que a chegada do ônibus estava prevista para às 10h30. De posse da informação, Emílio foi para o segundo piso do terminal rodoviário, encostou-se no parapeito, que dava visão ampla da área de desembarque. Retirou um cigarro do maço, acendeu, tragou-o e soltou a fumaça para o alto, enquanto relembrava seu passado.
A contínua chegada de ônibus das cinco regiões brasileiras fazia com que o terminal ficasse intransitável. Eram milhares de pessoas que chegavam, outras que partiam e mais tantas que aguardavam a chegada de parentes ou amigos.
Emílio estava ali para recepcionar seu amigo de infância, Wellington. Na verdade, Wellington era mais que amigo, o irmão que Emílio nunca teve, pois ele era filho único. Ambos tinham a mesma idade, nasceram no mesmo dia, e estudaram do pré-escolar ao 2º grau juntos, enfim, só se separaram quando Emílio veio tentar a sorte na Cidade Maravilhosa, fato ocorrido há quinze anos. Emílio teve um considerável progresso financeiro e profissional. Já era proprietário de um conjugado na Rocinha e trabalhava como supervisor de serviços gerais no rico condomínio American, em São Conrado, na Zona Sul. Emílio recebeu a carta de Wellington pedindo respaldo para que ele também viesse para o Rio de Janeiro em busca de uma oportunidade de vida melhor, pois ele havia se casado e era pai de uma criança de 1 ano e os três estavam passando grandes necessidades, inclusive fome. Diante do fato de penúria apresentado pelo amigo, Emílio não pensou duas vezes, não só deu o aval para o amigo vir, mas também mandou o dinheiro da passagem.
Mergulhado nas lembranças, Emílio não viu quando o ônibus entrou na área de desembarque. Foi surpreendido com os gritos de Wellington.

___ Emílio... Emílio, aqui embaixo... É assim que você ia me receber com festa?

___ Oh meu amigo, perdoe este meu deslize, de fato eu deveria estar aí embaixo para lhe dar um abraço de boas vindas, assim que você pusesse os pés no solo carioca.

___ Chegue cá...Venha me dar um abraço!

O encontro entre os dois foi de muita emoção. Abraçaram-se, choraram e se abraçaram mais vezes, até cantarolaram a música que cantavam na época de criança, à beira do Rio São Francisco, em noite enluarada.
“Meu papagaio das asas douradas
quem tem namorada brinca / meu papagaio
quem não tem fica sem nada / meu papagaio.
Meu papagaio não tem ouro nem tem brinco
em outras terras eu não finco / meu papagaio
minha terra é Sergipe / meu papagaio!”

Muitos dos presentes, tanto do primeiro e do segundo piso, bateram palmas e, mais uma vez, os amigos se abraçaram.
Emílio começou a perguntar pelas as pessoas que fizeram parte da sua vida, quando morou em Propriá.

___ Diga-me, a como andas seu Zequinha dos Cocos? E a professora dona Lili? Seu Zezé e dona Caçula, como estão? Irmã Eleonora, Irmã Maria José, Irmã Lourdes, ainda estão trabalhando na Pastoral da Educação? E Dom Castro ainda é bispo de Propriá?

___ Heim, calma Emílio! Haverá tempo de sobra para eu lhe dar a ficha de todo mundo de Propriá.

___ Cadê suas malas?

___ Estão lá do outro lado, perto das escadas rolantes, deixei as malas lá para lhe procurar, pois você não estava no portão verde.

___ Você é maluco Wellington? Aqui não é Propriá não. No Rio, se a pessoa não tiver cuidado, os ladrões roubam até o pensamento da gente, imagine malas!

___ Largue mão de ser besta, eu não sou matuto não. Tem alguém tomando conta das malas.

___ Alguém quem, cara pálida? Que eu saiba você não conhece ninguém aqui no Rio, além de mim, para confiar seus pertences.

___ Surpresa! Tenho uma surpresa pra você.

___ Que surpresa?

___ Vamos lá, você vai ver.

___ Então vamos!

Chegando no lado de embarque, no balcão de informações, Emílio viu uma bonita mulher, cabisbaixa, sentada sob as malas, dando de mamar a uma criança. Pasmo não entendendo por que Wellington, sempre caminhando na frente, se direcionando ao encontro da mulher. Quando chegaram diante da mulher, esta assustada levantou a cabeça, fazendo assim, com que Emílio a reconhecesse.

___ Priscila!... O que significa isso, Wellington?

Wellington pegou a criança dos braços da mãe e faz as apresentações.

___ Este é o meu filho, e esta é minha mulher.

___ Como sua mulher e seu filho? Você se casou com Priscila?

___ Sim! Estamos casados há dois anos, e do nosso amor nasceu Emílio. Priscila e eu colocamos o seu nome no nosso filho para homenageá-lo. O chamamos de Emilinho. Não lhe disse que tinha uma surpresa pra você?

___ Realmente eu estou muito surpreso.

Priscila que olhava para Emílio com um olhar de apavoramento nada tinha dito, até o marido lhe obrigar.

___ Oh Flor, cumprimenta o Emílio, nosso amigo e irmão.

___ Como vai você Emílio?

___ Bem! Acho que estou bem!

Emílio, pediu a Wellington que devolvesse a criança para a mãe, para os dois trocarem algumas palavras em particular.

___ Wellington, você me deve algumas explicações. Primeiro, o que a Priscila está fazendo aqui? Segundo, por que você não me contou que a mulher com que você havia se casado era a Priscila?

___ Etá, você e suas perguntas... Oh homem perguntador.

___ Wellington, não subestime minha inteligência. Você me escreve uma carta pedindo guarita para você poder trabalhar aqui no Rio, e você me aparece aqui casado com a Priscila, a mulher por quem fui apaixonado desde a meninice.

___ Nós dois éramos apaixonados Emílio.

___ Sim, nós dois. Entretanto fizemos um pacto, que nem um nem outro, ficaríamos com a Priscila, para não pôr em risco nossa amizade. E você, além de quebrar o pacto, ainda tem um filho com ela, e batiza a criança com meu nome. Tenha santa paciência, isso é demais pra minha cabeça.

___ Acho que fui indigno com você, meu amigo. Se você quiser, eu volto para Sergipe com minha mulher e meu filho daqui mesmo da rodoviária.

___ Sabe Wellington, eu até hoje só tinha um objetivo na vida, que era de ganhar dinheiro, ter uma independência financeira, para poder voltar a Propriá e casar com a Priscila. Pois, quando você me escreveu dizendo que havia se casado, eu pensei que seria com qualquer mulher, menos a Priscila. A mãe dela tinha verdadeira repugnância da sua pessoa, por que você não saia dos cabarés de Propriá.

___ Perdoe-me, Emílio, sei que errei. Vou pegar minha mulher e filho e vou voltar para onde nunca deveria ter saído.

___ Não! Você não vai fazer uma sandice dessa. Você é meu amigo, e Priscila, a partir de hoje, passará a ser somente a esposa do meu melhor amigo!

Ao voltarem para perto de Priscila, Emílio parabenizou-a pelo casamento com seu amigo Wellington e pelo nascimento de Emilinho. Priscila agradeceu a gentileza e acrescentou.

___ Eu não sei se o Wellington já lhe disse, mas além de colocarmos o seu nome no nosso filho, nós também queremos convidá-lo para ser padrinho de Emilinho.

___ Convite feito, convite aceito!

Solicitaram um carregador de malas e foram pegar um táxi, que os levaria à Rocinha. O trajeto se deu pela orla marítima, Priscila se mostrou fascinada pelas belezas naturais do Rio. Pelo o rádio do táxi, foi dada a notícia que estava acontecendo uma inclusão policial na Rocinha e, como era de praxe, os traficantes receberam a polícia com tiros. Como ao conjugado de Emílio ficava logo na entrada do morro, o taxista resolveu aventurar-se na empreitada de entrar na Rocinha. O aparato policial revistava pessoas e automóveis, que entravam ou saiam da Rocinha, a maior favela da América Latina.
Priscila observou que, no conjugado de Emílio, era tudo de bom gosto: móveis, eletrodomésticos e acessório domésticos. Emílio cedeu o único quarto para o casal amigo. Sempre procurando evitar troca de olhares com Priscila. Emílio retirou alguns pertences seus do armário do quarto, depois mandou Priscila arrumar as roupas dela, de Wellington e de Emilinho.
Enquanto Emílio e Priscila faziam as adaptações no conjugado, para melhores acomodações dos novos moradores, Wellington assistia à televisão na saleta e bebia cerveja, uma lata atrás da outra.
Haviam se passado onze meses e ainda Wellington não tinha conseguido emprego, a não ser um bico na quitanda da Rua C, na parte alta da Rocinha. Na quitanda, só trabalhou três semanas, foi dispensado por estar sempre cantando as freguesas solteiras e casadas, o dono do estabelecimento o demitiu antes que acontecesse o pior.
Certa feita, Emílio chegou em casa, por volta das 20h e encontrou Priscila chorando copiosamente e cheia de hematomas por todo o corpo.

___ O que aconteceu Priscila? Cadê o Wellington?

___ Não sei... Ele saiu!

___ Vocês brigaram?

Ela afirmou balançando a cabeça positivamente.

___ E o Emilinho.

___ Tá dormindo no quarto. Emílio eu preciso lhe falar algo.

___ Agora não Priscila, eu tenho que sair pra procurar o Wellington, antes que ele faça mais besteira.

___ Por favor Emílio. Me dê uma chance... Desde que cheguei aqui eu tento falar... Explicar algumas coisas e você, só faz me dispensar.

___ Falar o que Priscila? Você não me deve nenhuma explicação.

Emílio disse isso e foi se retirando em direção a porta, só parou quando Priscila fez uma revelação.

___ Você tem que deixar eu falar. Eu preciso lhe dizer que eu só aceitei me casar com Wellington, por que ele mentiu para mim, dizendo que você havia se casado aqui no Rio e já era pai de filhos.

___ Wellington foi capaz de inventar isso para forçar você a se casar com ele?

___ Foi?! Ele foi capaz... Por isso que ele me surrou quando eu disse a ele que iria lhe contar a verdade. Eu nunca deixei de lhe amar.

Emílio e Priscila ficaram inertes, olhando fixamente um para o outro, até quando ambos decidiram se entregar como homem e mulher, se amaram como só existissem os dois no mundo. Em seguida, Emílio saiu a procura do amigo, andou por ruas e vielas da Rocinha, foi encontrá-lo em uma roda de pagode no bar Parada dos Cornos, bebendo caipirinha. Emílio, tomado por uma ira nunca vista antes nele, foi a via de fato, arrastou o amigo pela camisa, para fora do bar, jogou-o na rua e os dois começaram a rolar no chão, trocando socos.
A turma do deixa disso interveio e conseguiu separar os brigões.

___ Emílio, o que o sergipano lhe fez pra você agir assim? Você sempre foi tão ponderado, aqui na Rocinha todo mundo lhe admira, justamente porque você é equilibrado e muito sensato. Vão para casa tomar um banho, vocês estão todo enlameados.

Esta fala foi dita por Tarcísio, líder comunitário da Rocinha, e um dos homens que ajudou a apaziguar os ânimos de Emílio e Wellington. Na Rocinha todos chamava Wellington de Sergipano.
Naquela noite, nenhum dos três falaram qualquer coisa entre si. O silêncio se apossou do conjugado. Mal amanheceu o dia Emílio saiu de casa, tinha passado toda a noite em claro, e chegou a uma conclusão. Foi até a administradora do condomínio e pediu as contas do emprego, o síndico, que lhe tinha bom apreço, tentou, em vão, dissuadir Emílio da idéia da demissão. Emílio foi irredutível no que queria.

___ Dr. Hugo Leonardo, eu queria, se possível, que o senhor aceitasse como meu substituto o meu amigo Wellington. Eu já havia pedido ao senhor, e o senhor me prometeu que, assim que tivesse uma vaga, o senhor o encaixaria no quadro de funcionários do Condomínio American!

___ Só pra mim entender melhor... você está pedindo as contas, somente para eu contratar esse seu amigo?

___ É!

___ Você não existe Emílio! O Brasil passa por uma monstruosa demanda de emprego e você larga um emprego de 15 anos, para ceder seu lugar a um amigo. É isso mesmo que você quer?

___ Este meu amigo tem capacidade para dar continuidade ao meu estilo de trabalho, o qual lhe agrada, assim como também aos condôminos. Portanto, peço-lhe que o contrate, ele é um pai de família honrado, honesto, por ele eu me responsabilizo.

___ Se é uma pessoa indicada por você Emílio, eu contrato. Você é um ser humano ímpar, Emílio. Um homem de grande coração. Durante os 15 anos de serviços prestados, honrou-nos com seu trabalho e com sua idoneidade. Mediante a esses fatos, eu farei o seguinte, em vez de você ser desligado do condomínio como se tivesse pedido as contas, desta forma, você perderia alguns direitos trabalhistas, eu mandarei você embora, você ganhará: fundo de garantia, seguro desemprego, mais os 40%. Se eu pudesse, eu contratava seu amigo, sem dispensar você, mas o estatuto do condomínio não permite a contratação de mais de doze funcionários, como todos os dozes funcionários são empregados há anos, e não existe nada que possa desabonar suas condutas, eu não posso dispensá-los só por dispensar.

___ Eu agradeço a sua benevolência Dr. Hugo Leonardo.

Emílio voltou para casa e fez a comunicação, a tarde, os dois amigos foram a administradora do condomínio. Emílio para receber sua rescisão e Wellington para ser admitido.
Os amigos ao saírem da Administração pararam em um quiosque na praia. Emílio pediu um coco e Wellington solicitou uma cerveja, no decorrer da conversa, Emílio revelou suas intenções.

___ Agora que você tem um emprego... que se diga de passagem um bom emprego, eu posso seguir meu caminho.

___ Não estou entendendo compadre! O que o senhor quer dizer com seguir seu caminho?

___ Eu vou voltar pra Propriá... Esses 15 anos deu pra ajuntar um bom dinheiro, vou botar um comércio em Propriá.

___ E o seu apartamento?

___ Você continuará morando lá com sua família, em troca me pagará um aluguel, afinal de contas você agora tem emprego e salário.

___ Você pode ir despreocupado, compadre, que todo mês eu vou depositar o dinheiro do aluguel e mais um pouco de dinheiro para ir abatendo na enorme dívida que tenho com o senhor.

___ Você não me deve nada!

___ Como não! Você sustentou a mim, a minha mulher e ao meu filho, até o berço do meu filho, foi você quem comprou.

___ Não há necessidade nenhuma de você me ressarcir das despesas que, por ventura, tive com você, com a comadre e com meu afilhado. Tudo que eu fiz, fiz com o coração, fiz pela nossa amizade. O depósito do aluguel é o suficiente.

___ Obrigado, amigo, por tudo. O que você fez por mim nem meu pai, se fosse vivo, faria. Você viaja quando?

___ Hoje à tarde.

___ Assim tão depressa?

___ O tempo urge.

___ Então vamos lá em casa, para você se despedir de Priscila e de Emilinho.

___ Não! É melhor não... Prefiro que você leve meu abraço e meu beijo aos dois.

___ E suas roupas, você não vai pegar?

___ Doe para a Associação de Moradores, lá eles doarão aos mais necessitados.

Os dois se abraçaram e choraram, Wellington não parou de agradecer ao amigo. Depois, Emílio pegou um táxi em direção ao Aeroporto Tom Jobim. Chegando ao aeroporto, Emílio foi direto ao porta-volumes, de onde retirou três malas e se dirigiu ao chekin, despachou as malas e foi a sala de espera aguardar o vôo que o levaria de volta a Sergipe, após 15 anos de ausência. Emílio havia planejado tudo milimetricamente em nome da amizade.